Por aqui têm sido ditas palavras azedas, escritos irónicos, esgalhanços de desesperança. Eu próprio, que tenho por costume ser bastante optimista, também tenho sucumbido a esta nuvem negra, não-radioactiva, que nos assola e que nos atira com crise e pec a uma face e à outra com lucros, ordenados e prémios gigantescos. Neste jogo desigual PEC 4 - Povo 0, onde o árbitro é ladrão e a equipa que ganha já há muito devia ter sido expulsa, parece não haver motivos para sequer continuar no desafio...
Felizmente pude ir uns dias a Londres onde fui mostrar o que de bem ainda sabemos fazer neste país e lançar a saudável inveja a tantos congéneres europeus que, incrédulos, descobrem que neste lamaçal (que já foi pântano em 2001) se trabalha bem. Se por vezes é na mais imunda estrumeira que nasce a melhor flor, garanto-vos que fui falar para algumas centenas de um lindo bouquet português.
Tive também oportunidade de ver sinais de esperança. Vi, por exemplo, esperança na ópera. Sim! Na mesma ópera que muito raramente me cativa, quantas vezes vulgar, chata, previsível, de temática desinteressante e argumento patético. Fui ver a Anna Nicole, uma ópera novinha em folha, estreada há umas semanas atrás. A ironia e o sarcasmo estiveram sempre em cena. O sonho americano, o star-sistem, os implantes de silicone e a vida fútil passaram ali no palco com uma eficiência e assertividade incríveis. No final, o azedo fica no ar e a heroína mata e morre. Além da excelente qualidade da música e do libretto, as vozes e o coro eram irrepreensíveis. Cereja no topo: havia um pequeno trio jazz que tocava lá no meio com o John Paul Jones (ex-Led Zeppelin) no baixo e Peter Erskine (ex-Weather Report) na bateria... Quando é que eu pensaria alguma vez ver dois heróis da adolescência a tocar numa ópera? Nunca!
Se há esperança na ópera, então meus caros, há esperança na vida! A Anna Nicole morreu, sucumbindo à futilidade e à falsa vida que viveu. Vamos lá tentar viver com a dura realidade, porque no final custa bem menos... ao fim e ao cabo já todos sabemos que na falsidade andámos todos a viver nos últimos 20 anos, e deu no que deu!
De aperitivo aqui ficam as imagens possíveis da ópera que vi na Royal pera House.
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