Contaram-me uma história surreal que se passou num país imaginário. Num daqueles países onde ainda se arrolam criancinhas e desempregados para baterem palmas aquando da visita das pessoas muito importantes.
Pois bem, certa vez nesse tal país imaginário houve uma visita a uma pequena cidade de uma delegação que incluía vários ministros. Encabeçava a visita o primeiro, o principal. Era dono de estampa desportiva e bom ar. O mulherio suspirava por ele e as mais velhas adoptavam-no como o filho que gostariam de ter tido.
Ao entrar num salão, tinha à sua espera um jovem instrumentista que dedilhava com mestria uma guitarra, executando uma peça de enorme dificuldade. Ora o primeiro, muito dinâmico, brilhante e habituado a fazer muitas coisas ao mesmo tempo, nem deixou o mancebo acabar. A meio da execução dispara: “isso é muito difícil, não?”. O guitarrista imperturbável continuou. Mostrou que não está à altura dos desafios desse país. Tem de melhorar e ser capaz de tocar Tárrega, falar ao mesmo tempo com quem o ouve e se possível com uma vassoura bem incrustada varrer a sala. Assim será um homem de futuro!
Atrás vinha uma ministra. Sim, uma mulher, porque neste país imaginário há muito se cumpria a paridade. A senhora tinha habitualmente um ar carregado. Na verdade, nada devia à beleza, apesar de naquele dia ter posto uns andaimes por dentro dos lábios que lhe sustentavam um leve sorriso. Ouviu com atenção uma flauta. No fim, abeirou-se do flautista e perguntou-lhe as habilitações. “8º Grau? Então sente-se preparado para ensinar no 1º ciclo?”. Mais uma vez o nosso músico envergonhou a classe pois num rebate de honestidade disse: “Claro que não!”. A visita continuou, o séquito seguiu, os músicos arrumaram os seus instrumentos e voltaram acabrunhados. Tinham aprendido com as suas falhas lições de vida que escola alguma é capaz de ensinar.
Entretanto, tenho andado um pouco confuso… e acho que estou a confundir tudo. Na realidade acho que ninguém me contou esta história. Acho até que isto tudo se passou à minha frente há poucos meses atrás. Mas acredito que seja mesmo do cansaço, ando mesmo muito cansado...
Em Portugal este ano a Música passou a ser ensinada no primeiro ciclo juntamente com o Inglês e a Educação Física integrada em algo que se chama “enriquecimento curricular”. O processo de recrutamento de professores foi no entanto diferente: enquanto para Inglês e Educação Física se pedia uma licenciatura e a profissionalização, para Música o 8º grau de uma academia ou o 12º ano de um curso profissional chegava. A remuneração varia mas pode ser de 5€ por hora. Recibo verde, é claro! A formação de professores não foi feita, nem tão pouco existe uma orientação, um programa. Mas isso para que importa? Estamos todos felizes porque os nossos filhos já têm Música na escola! E que bom será ouvi-los já para o ano a brilharem no Festival da Canção Júnior!
Pois bem, certa vez nesse tal país imaginário houve uma visita a uma pequena cidade de uma delegação que incluía vários ministros. Encabeçava a visita o primeiro, o principal. Era dono de estampa desportiva e bom ar. O mulherio suspirava por ele e as mais velhas adoptavam-no como o filho que gostariam de ter tido.
Ao entrar num salão, tinha à sua espera um jovem instrumentista que dedilhava com mestria uma guitarra, executando uma peça de enorme dificuldade. Ora o primeiro, muito dinâmico, brilhante e habituado a fazer muitas coisas ao mesmo tempo, nem deixou o mancebo acabar. A meio da execução dispara: “isso é muito difícil, não?”. O guitarrista imperturbável continuou. Mostrou que não está à altura dos desafios desse país. Tem de melhorar e ser capaz de tocar Tárrega, falar ao mesmo tempo com quem o ouve e se possível com uma vassoura bem incrustada varrer a sala. Assim será um homem de futuro!
Atrás vinha uma ministra. Sim, uma mulher, porque neste país imaginário há muito se cumpria a paridade. A senhora tinha habitualmente um ar carregado. Na verdade, nada devia à beleza, apesar de naquele dia ter posto uns andaimes por dentro dos lábios que lhe sustentavam um leve sorriso. Ouviu com atenção uma flauta. No fim, abeirou-se do flautista e perguntou-lhe as habilitações. “8º Grau? Então sente-se preparado para ensinar no 1º ciclo?”. Mais uma vez o nosso músico envergonhou a classe pois num rebate de honestidade disse: “Claro que não!”. A visita continuou, o séquito seguiu, os músicos arrumaram os seus instrumentos e voltaram acabrunhados. Tinham aprendido com as suas falhas lições de vida que escola alguma é capaz de ensinar.
Entretanto, tenho andado um pouco confuso… e acho que estou a confundir tudo. Na realidade acho que ninguém me contou esta história. Acho até que isto tudo se passou à minha frente há poucos meses atrás. Mas acredito que seja mesmo do cansaço, ando mesmo muito cansado...
Em Portugal este ano a Música passou a ser ensinada no primeiro ciclo juntamente com o Inglês e a Educação Física integrada em algo que se chama “enriquecimento curricular”. O processo de recrutamento de professores foi no entanto diferente: enquanto para Inglês e Educação Física se pedia uma licenciatura e a profissionalização, para Música o 8º grau de uma academia ou o 12º ano de um curso profissional chegava. A remuneração varia mas pode ser de 5€ por hora. Recibo verde, é claro! A formação de professores não foi feita, nem tão pouco existe uma orientação, um programa. Mas isso para que importa? Estamos todos felizes porque os nossos filhos já têm Música na escola! E que bom será ouvi-los já para o ano a brilharem no Festival da Canção Júnior!
3 comentários:
Oh!oh! Perdão! Já havia música antes, nas escolas do dito 1º!
Por sinal, o que então era ensinado, segundo projectos com nível, ficaram agora impedidos de funcionar...! Coisas...
tem programa, e nao é preciso ser o mozart para ensinar crianças de 7 anos. É preciso acima de tudo vontade, e à vontade com crianças.
Existem indicações, não existe programa bem definido, claro. De facto não é preciso ser Mozart. Um pouco mais de conhecimento e até sabia que Mozart não era tão bom professor assim... pelo menos diziam os seus antigos alunos. Se génio não é garantia de ser bom professor. À-vontade é preciso, sem dúvida, mas formação e objectivos bem definidos é fundamental. O achar-se que o 1º ciclo não necessita de um cuidado especial a nível dos professores dá nisto: o país que temos!
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